domingo, 9 de novembro de 2008

Sou gerente, e agora?

José trabalha numa empresa de informática que desenvolve softwares para venda e faz a manutenção dos sistemas. Sempre foi dedicado e busca estar sempre atualizado. Assim, dominava as ferramentas de informática mais modernas e desenvolvia aplicativos que atendiam muito bem a sua clientela. Daí para o reconhecimento interno na organização foi um pequeno passo.

Inicialmente, foi chamado para opinar em reuniões técnicas, dado seu conhecimento aprofundado. Depois, recebeu a incumbência de desenvolver com mais três programadores um novo software. Cada um fez sua parte dentro dos prazos e tudo ficou pronto na forma como se queria. Ponto para o José!

Então, chegou o dia em que lhe deram um projeto inteiro sob sua responsabilidade! Saiu radiante! Mil idéias, pronto para colocar tudo no papel, discutir com as pessoas sobre o que cada um devia fazer e começar a programar, algo que ele gostava muito. Acreditava que aquele seria seu maior projeto.

As coisas começaram bem, havia 12 pessoas para trabalhar com ele, equipamentos e a descrição das necessidades do cliente. À medida que o projeto prosseguia, José começava a sentir dificuldades, pois toda hora ele tinha de parar sua atividade para resolver questões como atrasos ou faltas ao serviço, pedidos da equipe pouco relacionados ao trabalho, equipamento que estragou, comunicar decisões e metas, trabalhos que deveriam ser refeitos, entender por que o que deveria ser feito não o foi, e assim por diante.

Algumas vezes, José chegou a pensar que ele não falava a mesma língua dos seus subordinados, pois solicitava trabalhos à equipe e eles os faziam de outras formas. Com freqüência tinha de ficar repetindo as mesmas solicitações.

Ahhh, e a pressão dos chefes! ‘Tudo é para ontem nessa empresa’. E a equipe! Volta e meia as reclamações chegavam aos seus ouvidos por meio de terceiros. Estava ficando insuportável, chegou a pensar em desistir. Ele sabia que fazia de tudo para melhorar. O que estava errado?

O que estava errado é que uma velha prática organizacional mais uma vez se fez presente. Escolhe-se um excelente técnico para desempenhar a função de gerente, mas não lhe é oferecida uma preparação adequada para a atividade. Como resultado, muito provavelmente a empresa perde um técnico e ganha um gerente problemático. Claro que há pessoas que conseguem se adequar a nova função e rapidamente começam a aprender como gerenciar pessoas, mas, em geral, há um custo psicológico considerável.

Bem, então é importante descrevermos melhor o que é gerenciar, distinguir gerente de líder e reconhecer as práticas ou técnicas que são consideradas mais efetivas para essa função. Esses são os propósitos desse texto.

Mattos (1991) identifica que o gerente é aquele indivíduo que recebe uma autoridade investida pela organização, pela qual exerce a direção e o controle das ações de seus subordinados. Ele assume o comando de uma parte da empresa e a representa dentro de limites explícitos. Ainda, segundo esse autor, a função gerencial tem dois lados: a autoridade de quem nela foi investido e a aceitação dos seus subordinados.

Mattos (1991) prossegue apresentando o que constitui a liderança, explicando-a como um fenômeno relacional ou interpessoal que não se deve a um atributo de personalidade. Assim, a liderança estaria na assimetria da relação interpessoal com maior poder em um dos participantes dessa relação. Alguém poderia ser líder numa relação e liderado em outra. Liderança não é atribuída, ou seja, constitui-se a partir das relações que ocorrem entre as pessoas. Parece que um gerente deve ir além de suas atribuições formais e alcançar a liderança de seus subordinados para alcançar melhores resultados.

Muitos estudos são realizados para entender o que os líderes fazem e como conseguem alcançar esses resultados. Bennis e Nanus (1988) estudiosos do tema liderança e que apresentaram as condições para uma liderança transformadora, entendem que liderar é “influenciar, guiar em direção, curso, ação, opinião”. Os autores distinguem administradores de líderes, afirmando que os primeiros “fazem as coisas de forma certa”, ou seja dominam as rotinas, enquanto os últimos “fazem a coisa certa”, portanto atuam com visão de futuro e julgamento. Assim, na visão deles um excelente administrador conseguiria manter o funcionamento da empresa em ótimos níveis, mas um líder a faria conquistar maior participação no mercado.

Mas, o principal é saber o que o líder faz, como ele alcança o que se propõe a fazer e como consegue que outros assim o façam. Depois de mais de uma década de pesquisa, Judith Komaki (1998) desenvolveu um instrumento observacional para medir o comportamento de supervisão. Denominado OSTI (Operant Supervisory Taxonomy and Index) o instrumento fornece oito categorias amplas do comportamento de supervisão e todo o comportamento observado pode ser categorizado nessas categorias, são elas:

(1) conseqüências de desempenho: comunica uma avaliação de ou indica conhecimento do desempenho de alguém;

(2) monitoramento do desempenho: coleta informações a cerca do desempenho de alguém;

(3) antecedentes de desempenho: instrui, relembra ou comunica expectativas de desempenho para alguém;

(4) própria performance: refere-se a sua própria performance (por exemplo conhecimento de qual é o seu desempenho);

(5) relacionado ao trabalho: refere-se à questões do trabalho, mas não ao desempenho do subordinado;

(6) não relacionado ao trabalho: não relacionado às questões do trabalho, tais como comentários sobre futebol, férias ou política;

(7) sem comunicação: interage com outro(s), mas nada diz.

(8) solitário: referindo-se a situações na qual o supervisor não está interagindo com ninguém. Por exemplo em sua mesa de trabalho, escrevendo nos seus papéis.

É difícil resumir a obra de Judith Komaki dada sua densidade, mas uma das contribuições que considero mais relevantes desses estudos conduzidos por Komaki é que líderes efetivos dispensam mais tempo em comportamentos de monitoramento (via amostragem de trabalhos dos subordinados) e fornecimento de conseqüências de todos os tipos (positivas, neutras ou negativas), mas predominantemente positivas. Esses líderes efetivos também gastam pouco tempo em atividades solitárias ou sem comunicação.

Assim, eles rapidamente entregam um antecedente ao desempenho do liderado (uma orientação de como o trabalho deve ser feito ou expectativa de qualidade) e se mantêm no monitoramento, expressando interesse no que os liderados estão fazendo, tornando-se acessíveis e, portanto, os liderados os abordam com mais freqüência. Discutem bastante o desempenho e seus resultados. Como são capazes de prover conseqüências ao desempenho e, usualmente positivas, as relações são de aproximação, obtendo um vai-e-vem de troca entre líderes e liderados, na qual o foco é o desempenho do liderado.

Um característica essencial no desempenho do líder é que essa seqüência de Antecedentes, Monitoramento e Conseqüências (AMC) é realizada num período de tempo relativamente curto.
Bem, nesse ponto é possível perceber que um gerente pode ser líder, e até deve sê-lo. Mas algumas habilidades são necessárias para alcançar as características de um líder efetivo conforme os estudos de Komaki (1998). Selecionamos duas delas sobre as quais nos aprofundaremos nos próximos artigos, de forma a permitir que o gerente seja capaz de apresentar os antecedentes, atuar no monitoramento e prover conseqüências.

- As habilidades assertivas e de comunicação; e,

- O estabelecimento de metas e o reconhecimento como técnica gerencial.

Referências:
Bennis, W. e Nanus, B. (1988) Líderes: estratégias para assumir a verdadeira liderança. São Paulo: Harbra
Komaki, J. L. (1998) Leadership from an Operant Perspective. New York: Routledge.
Mattos, R. A. (1991) Gestão e Democracia na Empresa. Brasília: Editora Livre

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